terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Insônia

Em um quarto fechado, questionamentos tornam-se expostos à meia-luz de um antigo abajour posicionado ao lado do telefone, que permanece silencioso desde que os dias tornaram-se chuvosos. Acendo um cigarro, enquanto observo os minutos de um simples relógio, ordeno-me a não desvendar as horas. O único som existente além da hélice quebrada do meu ventilador é o insolente cachorro do vizinho, que ousa latir quando algum carro desliza sobre o asfalto. Logo eu, que por vezes em meio ao silêncio noturno, ouvia atentamente a desajeitada melodia que seus dedos reproduziam no violão. Basta fechar os olhos para que eu possa contemplar teus gestos.
Contenho um suspiro.
Meus lábios vermelhos traduzem-se em dor e suplicam por mais um trago de racionalidade. A garrafa de vinho quase vazia sobre a mesa, completa o transbordamento de ilusões em que encontro-me.
Entrego-me entre incessantes lembranças.
A escuridão que limitava-se ao exterior de minhas janelas, ocupa lentamente o cenário e por fim, invade de modo violento minhas veias com um dose exata de calafrios. Ao tocar o chão gelado com os meus pés descalços, flutuo imperceptivelmente como alguém que dança uma solitária canção. Algum dia, talvez, me escreverás palavras encharcadas de álcool, incertezas e saudades.
Talvez.
Por enquanto, restou-me apenas uma fotografia guardada na carteira, um atormentado vazio existente na cama e o imenso desejo de adormecer novamente entre os seus braços.

sábado, 19 de junho de 2010

Remeter a um destinatário

“Uma folha em branco, deixando escapar segredos inteiros. Iluminada com a chama presente de uma vela quase a se apagar. Singular. Como uma fotografia em preto e branco, exibindo detalhes que possam evidenciar um possível poema. Sem intenções de querer detê-la com minhas esquecidas promessas – talvez não possa, talvez não queria, talvez. Tudo o que sei, conscientemente, é a primordial necessidade de iniciar. Como quem sussurra ao pé do ouvido pertinentes desejos e faz surgir um arrepio discreto, que nasce com o toque das mãos na nuca e espalha-se por todo o corpo, emitindo mensagens fragmentadas. Apenas leia-me, tudo o que peço. Se por acaso chegou até essas linhas, prossiga... Mesmo que a ti soe apenas como palavras levianas e desesperadas. Mas caso sinta alguma familiaridade irreconhecível, as devore sem porquê. Reconheço: algumas vozes confidenciaram a meus ouvidos que estavas a sorrir, um daqueles risos temperados e agudos, os mesmos que faziam estremecer o chão em que pisávamos. Outras vozes, mais distintas e delicadas, confessaram-me que entrelaçou teus dedos em outros que não eram os meus. Acabaram por fim, recriando em meus pensamentos imagens não vistas. Das quais despertavam em meu ser um ódio ininterrupto e mortífero, que somente um homem que já possuiu em seus braços uma ninfa de ancas juvenis e olhares amedrontados, poderia compreender. Agonizei por dias sem fim diante de um martelar de ponteiros. Era possível me encontrar com as mãos no bolso entre algumas confusões, observando o caos alheio como alguém que espera, ou simplesmente, examina o tempo passar diante dos próprios olhos. E durante algumas noites, abraçava o vazio, que batia em minha porta ao mesmo horário em diferentes trajes e com o mesmo sorriso planejado. Refugiava-me em outros corpos que não eram os teus – sem pudor, sem querer. E por mais belos que fossem, não continham teu cheiro contido nos cabelos, o entrelaçar dos teus braços em conjunto com tuas pernas, e principalmente, sua feminilidade aguçada em sigilo. Os possuía em prantos interiores, sabendo que por mais que os quisesse mantê-los permanentes, um passado ainda continha meus gestos. Não peço perdão, o orgulho constrói em mim barreiras inacessíveis. Não me responda, enquanto o telefone permanecer em silêncio, será tua voz dizendo onde estás. E não volte, sou incapaz de manter minha própria sobrevivência sem que haja dor. Escrevo-te cartas e não as envio: limito-me a uma perpétua confusão. Apago, amasso ou deixo de lado, criando uma nova metáfora de inexistência. E as guardo, junto de tantas outras no fundo de uma gaveta, trancando-as com meu egoísmo. A chama apaga-se e estou de volta a escuridão”.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Desvanecer de outono.

- Sentirei sua falta.
- Não diga nada.
- Está frio e essa chuva encharcará tuas roupas.
- A neblina irá dissipar meus sentidos.
- E quem te fará companhia?
- As estrelas.
- Pare com essa bobagem! É perigoso, está escuro demais lá fora!
- Aqui dentro também.
- Não sabes o que é escuridão.
- O que é, afinal?
- É preciso sentí-la ao invés de enxergá-la.
- Definitavemente, você não sabe o que é escuridão.
- Porque pensas assim?
- Não se pode sentir ou enxergar, é preciso vivê-la, diariamente. Só assim saberás.
- Não compreendes. Sentirei saudades.
- Não sentirá!
- Porque não acredita?
- Não há porquês.
- Então o que há?
- Apenas um vazio agudo que me ronda há dias.
- Deveria ter me procurado.
- Eu tentei. Mas percebi que seria tarde demais.
- Nunca será.
- Confundo-me, qualquer caminho que eu vá, restará a dor.
- Restará dor, enquanto procurá-la.
- Não, ela existe em meu olhar, não percebe?
- Eles só refletem medo.
- Medo de serem tragados por suas pupilas cristalinas. Devo prosseguir...
- P'ra onde?
- Qualquer lugar.
- (silêncio)
- De preferência, em teus abraços.
- Permaneça.
- Adeus.
- Não posso acreditar que em instantes irá atravessar aquela porta...
- Então me diga, como partir se desejo ficar?

quarta-feira, 24 de março de 2010

Abstracto


Vejo um abismo em minha frente... Tormento lapidado em pedras e revestido por espinhos interiores, vindo da minha mais nociva entranha e de uma dolorosa cicatriz jamais revelada, rasgando-me sem pudor até o ultimo fio de esperança, que a essa altura, já se tornou inexistente. Desato os nós que prendem minhas pernas, e com berros interiores tento arrancá-los de minha garganta. Em que direção se vai? Pergunto ao vento, que acaba de bagunçar meus cabelos, mas só ouço minha própria voz em ecos perambulando por um deserto de interrogações. Afinal, o que será? Dói-me exaustivamente cada passo dado sem exatidão, me limitando a uma realidade sobreposta por tons amargurados em degrade. Deixo com que meus dedos incendeiem e assopro instantaneamente uma delicada fumaça em direção ao céu, soltando suspiros abafados – pura distração. As mãos que traziam um afago contido e mantido em sigilo, agora servem apenas como conchas vazias no qual derramo minhas lágrimas, em noites afora quando em um instante inesperado exijo o extremo.
Cenas se repetem com a mesma melodia, uma delas chama minha atenção por toda a simplicidade que a cerca: Através das paredes, o escuro nos confidenciava uma lucidez que simultaneamente penetrava no silêncio de nossos corpos ainda vibrantes, estendidos sobre o vazio atormentado de uma meia lua solitária. Cravo meus dentes em tua pele, enlaço meus braços ao redor dos teus, afogando-me em súplicas subordinadas. Pressinto o que está por vir e me rendo pontualmente. De modo em que me encontro submersa em ti. Afogo-me em tua lucidez e sucessivamente, encontro-me a deriva por estar ausente de mim, contigo. Em meio a todos esses detalhes imperceptíveis, estava o seu perfil azul, no qual tive a exatidão de que me lembraria a cada domingo nublado. Deixo de lado o aprofundamento do meu “eu” tragicamente belo e me atrevo a pronunciar o “nós”. Sim, enfim.
Desperto, olhos pesados e uma ânsia de compaixão não obtida. O silêncio persiste, chegando a ser ensurdecedor. Há um aviso na porta que diz: “Permaneça atento”. Observo a noite tornar-se dia pela moldura da janela, as estrelas se despedem dando lugar a uma plenitude adormecida. Sangro, enfim.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Fragmentos de uma ausência

Chove, consigo ouvir cada gota que toca delicadamente o telhado. Examino tudo ao meu redor. Paredes claras, o cheiro mórbido de cigarro, a chuva que continua a embaçar a janela, constituem um ambiente de um drama casual vivido. Perplexo, sentado á beira da cama com sua carta amassada em minhas mãos de tantas vezes já relida, tantas vezes já mantida distante por tamanha precaução. Cenário restrito apenas a imensidão que separa suas letras de mim. Oh meu bem! Se soubesses o quanto me amargura teu sorriso, essa tua distância cada vez mais presente. Ah se tu soubesses, tu não serias assim. Nesse enlace de formas e sons que prendem o meu fôlego, inibindo minha ofegante respiração, custo a decifrar partículas que se estendem por minha vaga lembrança. Lembro-me de outras tardes... Outras noites, antes e depois. Entretanto, contenho-me, apenas esboço com palavras sinceras todo o meu âmago – vagamente compreendido.
Ouça o silêncio, ouça o que lhe digo sem pronunciar.
Apenas atrevo a dizer-lhe, que foi com certa fúria que cometi atos impensados. Deparava-me com uma inicial ausência, que sucessivamente tornava-se angústia. Perco-me quando não te encontro. Há uma sede insaciável dentro de mim. Sede de vozes e afagos, olhares e abraços. Abraços e abraços... Meus braços flutuam esparsos como se não fizessem parte de mim, tentam com urgência encontrar uma definição – entre os espaços de seu obliquo sorriso. Acabam então se unindo solitários, à distância. Ainda sinto sua face pousando em minhas cálidas mãos, nossos gestos que inicialmente surgiam desajeitados, por fim se uniam, transfigurando uma realidade desejada por ambos. Teus olhos repletos de singularidade vinham em minha direção suplicando por qualquer frase, sem exigir absolutamente nada. Prendia-me a eles por querer-te minha sendo seu, pela eterna vontade de não partir. Tão real tu vieste, tão fiel fizestes de mim uma simples aventura constante. Que maneira há de conter toda essa brusca fugacidade em que me encontro? Incógnitas repetitivas compõem o meu cotidiano desassossegado. Desassossego esse que me dilacera e permite com que me encontre aqui sozinho, parado dentro de uma esfera constituída apenas pelo inalcançável desejo de não sentir.
Continuo a preferir o silêncio.
Ouço vozes, não as respondo. Não quero interrupções nesse instante em que tudo me dói, fere. Encosto no travesseiro, acendo mais um cigarro. A cada trago hesito em lhe procurar, enfim, solto a fumaça em direção ao vazio que me cerca. Desta vez não me contenho, choro em meio a lençóis bagunçados, os mesmos que guardavam teu cheiro. Choro junto à chuva, junto a tuas lembranças, as tuas palavras, o teu corpo inexistente.

domingo, 11 de outubro de 2009

Há de ser o momento exato?
Por entre versos rimados, provavelmente sentidos, quero a proximidade da resposta singela. Palavras jogadas no papel repentinamente - cruel impulsividade. Onde meus anseios tornam-se poemas, meus amores melancolia. Pensamentos subterrâneos jorrados delicadamente por um deserto límpido. Em meu infinito visto só há nuvens, vez ou outra olhando para o lado se avista pétalas luminosas de frescor apurado...
Oh, tolos mortais! Fazem uma vida passar apressadamente entre prédios, enquanto eu aprecio o instante incerto, desejo inexato da hora não vivida. O imensurável questionar de pensamentos embriagantes.